OPINIÃO O Estado de S.Paulo
06 de julho de 2012 | 3h 09
Levantamento
da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp),
divulgado recentemente, mostra que a polícia vem prendendo mais, mas os
inquéritos não são conclusivos, os crimes mais violentos continuam não
sendo esclarecidos e a maioria das investigações é arquivada. A Enasp é
uma parceria entre o Ministério da Justiça, o Conselho Nacional do
Ministério Público (CNMP) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Até
a formação dessa parceria, o Executivo, o Ministério Público e o
Judiciário não tinham conhecimento do número de inquéritos criminais
existentes no País. Após a criação de um banco nacional de dados, a
Enasp passou a estabelecer metas de produtividade para as
procuradorias-gerais de Justiça e para as varas de execução criminal.
No
ano passado, foram fixadas cinco metas. O relatório recém-divulgado
trata da Meta 2, cujo objetivo era concluir, em abril de 2012, todos os
92 mil inquéritos sobre assassinatos instaurados no País até 31 de
dezembro de 2007 e ainda pendentes. O levantamento da Enasp revela que
só 32% da meta foi atingida. Mesmo assim, o resultado foi comemorado
pelo Ministério da Justiça, pelo CNMP e pelo CNJ. Antes da Meta 2, o
índice de conclusão dos inquéritos de homicídio doloso abertos até 2007
variava entre 5% e 8%.
Segundo o levantamento, dos 135
mil inquéritos relativos a homicídios dolosos instaurados até dezembro
de 2007, apenas 43 mil foram concluídos. Destes, só pouco mais de 8 mil
foram convertidos em processos judiciais. O estudo também mostra que
mais de 80% dos inquéritos relativos a homicídio doloso - em que há
intenção de matar - foram arquivados. O arquivamento decorreu da
prescrição dos crimes, da falta de identificação de autoria, da falta de
provas e da morte dos assassinos. "Muitos inquéritos incluídos na Meta 2
sequer tinham o laudo cadavérico feito. Colocá-los para andar já é
motivo de comemoração", diz Taís Ferraz, conselheira do CNMP,
coordenadora do Grupo de Persecução Penal da Enasp e uma das
responsáveis pelo aperfeiçoamento do Inquerômetro 2.0. Trata-se de um
sistema eletrônico desenvolvido pelo Ministério Público de Rondônia e
pelo CNMP que permite o acompanhamento, em todo o País, do andamento,
das diligências pendentes e da conclusão dos inquéritos criminais. Com
um banco de dados alimentado mensalmente por informações enviadas pelos
Estados, o Inquerômetro 2.0 também divulga um ranking estadual com
relação ao cumprimento de metas de produtividade fixadas pela Enasp.
Graças
a esse sistema se pode verificar que em Alagoas foi extraviado mais de
mil dos 4.180 inquéritos instaurados entre 1990 e 2007. "A Polícia Civil
não conseguiu informar onde estão e qual o destino que tomaram", diz a
promotora Karla Padilha. Segundo o Mapa da Violência do Ministério da
Justiça, Alagoas é o Estado mais violento do País, com 66,8 homicídios
por 100 mil habitantes.
Pelas estatísticas do
Inquerômetro 2.0, Alagoas também é o Estado nordestino com pior
desempenho em matéria de conclusão de inquéritos criminais. Durante a
Meta 2, a polícia alagoana só conseguiu concluir 14,9% dos inquéritos
desse tipo instaurados até 2007. O Estado que registrou a produtividade
mais baixa foi Minas Gerais, onde foi concluído apenas 1,9% dos
inquéritos relativos a esse tipo de crime. Somente o Acre atingiu os
100% da meta fixada pela Enasp. Em São Paulo, o índice foi de 46,7%.
Segundo
os coordenadores da Enasp, o alto índice de arquivamento dos inquéritos
sobre homicídio doloso se deve a vários fatores. Por exemplo, 12
Estados não preenchem há anos os cargos vagos da Polícia Civil; em 14
faltam equipamentos para perícia; em 15 as delegacias não têm condições
mínimas de trabalho; e em 5 elas não têm computadores e acesso à
internet, o que obrigou o CNMP a fazer contagem manual dos inquéritos
parados em delegacias. O próximo relatório da Enasp, que será divulgado
em outubro, versará sobre as metas relativas à pronúncia dos réus e ao
julgamento das ações penais.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
- Ora, diante de fatos que mostram a polícia prendendo mais, mas sendo
inoperante na conclusão dos inquéritos que são arquivados por falta de
esclarecimento, fica evidente a falta de responsabilidade e sintonia do
MP e do Judiciário em exigirem mais efetividade do ciclo policial
(preventivo, investigação e perícia). Ocorre que no Brasil não existe um
Sistema de justiça Criminal, mas instrumentos de coação, justiça e
cidadania prestando serviço público de forma isolada, corporativa e sem
compromisso com o interesse coletivo e social exigido na preservação da
ordem pública e da incolumidades das pessoas e do patrimônio. Cada um
cumpre o seu papel preocupado apenas com o "umbigo" e empurrando a
responsabilidade para o outro sem se comprometer com a finalidade de
todos. Aí está o cerne da impunidade e não na apenas no esforço
inoperante de polícias fracionadas no ciclo policial, sem controle,
suporte ou continuidade.
Sem falar que a constituição
brasileira excluiu as policias como forças auxiliares e essenciais à
justiça, assim como "esqueceu" o MP, a defensoria e o Judiciário do
conjunto necessário à preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio.