O Brasil precisa de um Ministério Público fiscal, probo, desburocratizado e inserido num Sistema de Justiça Criminal ágil, integrado e coativo, próximo das questões de ordem pública e envolvido dentro das corregedorias na defesa e execução das leis e na consolidação da supremacia do interesse público, contra a corrupção, imoralidades, improbidades, criminalidade e violência que afrontam a confiança nos Poderes, o erário, a vida, a educação, a saúde, o patrimônio e o bem-estar do povo brasileiro.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

FREIO NOS PROMOTORES


Projeto abre debate sobre poder do MP de investigar. Uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que tramita com rapidez na Câmara dos Deputados proíbe o Ministério Público de fazer investigações criminais. FÁBIO SCHAFFNER | BRASÍLIA - ZERO HORA 08/02/2012

Se for aprovada, a medida inviabilizará, por exemplo, apuração semelhante à que elucidou o escândalo do mensalão, em 2005.

De autoria do deputado Lourival Mendes (PT do B-MA), a PEC 37 já passou pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Sob intensa pressão de sindicatos policiais, a iniciativa foi aprovada em dezembro, depois de seis meses de tramitação – uma agilidade poucas vezes vista na Casa. Outros projetos de teor semelhante, também limitando as ações do MP, estão parados na CCJ desde março de 2006.

Dos 31 deputados que votaram a favor da proposta, pelo menos 19 responderam a algum questionamento na Justiça movido pelo MP. O texto agora será remetido para discussão em uma comissão especial e depois vai à votação em plenário. Além de excluir o MP das apurações criminais, a PEC também afeta instituições como o Banco Central, a Receita Federal e o INSS, que mantêm unidades de inteligência e estariam impedidas de investigar crimes financeiros e previdenciários. A polêmica proposta divide opiniões.

Polícias querem exclusividade

Para o diretor do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone, o juiz aposentado Walter Maierovitch, a PEC é um retrocesso para o sistema jurídico. Maierovitch lembra que o crime organizado – uma falange que transpõe fronteiras e aumenta seus lucros de 30% a 40% por ano – tem um braço junto ao poder político e age para garantir a impunidade.

– Essa PEC é uma vitória do crime organizado e dos corruptos. O MP é o representante da sociedade e o titular da ação penal. Como pode ser impedido de investigar? – questiona o magistrado, especialista em combate à corrupção.

De acordo com o texto, caberá somente às polícias civis dos Estados e à Polícia Federal a abertura e a condução de inquéritos criminais. Assim, só quem primeiro poderá dizer se alguém praticou um crime ou não é um delegado. Ao MP, caberá ajuizar a ação, arquivá-la ou solicitar mais diligências, caso considere necessário.

Lourival, que também é delegado, diz que a proposta termina com a briga de competências entre a polícia e o MP e evita o descontrole nas apurações conduzidas por promotores.

Colega de Lourival na CCJ e promotor de carreira, o deputado Vieira da Cunha (PDT-RS) apresentou um voto em separado durante a votação da PEC, mas foi derrotado. Para o gaúcho, a proposta é nociva à sociedade e esbarra em sucessivas decisões do Supremo Tribunal Federal, que tem amparado as investigações realizadas pelo MP:

– Essa PEC afronta a Constituição. Se for mantida, a investigação passa a ser um prato feito servido pela polícia, mesmo que os promotores possam requisitar novas diligências.

Titular de um dos escritórios de advocacia mais requisitados de Brasília, José Eduardo Alckmin reconhece que a PEC fomenta uma discussão delicada, mas considera prudente a condução dos inquéritos pela autoridade policial. Conforme o advogado, quando a investigação está concentrada no MP, não há controle por parte do Judiciário.

– Embora não seja recorrente, existe a possibilidade de abuso por parte dos promotores. A polícia está mais preparada para investigar – sustenta Alckmin.

Acostumado a investigar crimes, o promotor Mauro Rockenbach discorda:

– Lamento que a Polícia Civil deste país esteja tão concentrada na aprovação da mudança que impede o MP de investigar quando deveria estar debruçada na solução das centenas de milhares de ocorrências que se acham empilhadas nas delegacias e sem qualquer providência.

“O MP tem de parar de investigar e cumprir sua função”. Lourival Mendes (PT do B-MA), Deputado federal

Delegado da Polícia Civil do Maranhão e deputado federal em primeiro mandato, Lourival Mendes (PT do B) é autor da proposta de emenda à Constituição que exclui o Ministério Público da condução de inquéritos criminais. Para o parlamentar, os promotores estão extrapolando sua competência em investigações que depois são questionadas na Justiça.

ZH – Por que o senhor quer afastar o MP das investigações criminais?

Lourival Mendes – Está mais do que na hora de se discutir essa matéria. É uma questão que está se arrastando e cria uma situação de embaraço e de insegurança jurídica. A Constituição deixa muito claro que a investigação criminal compete à polícia judiciária. Portanto, não é verdadeira a afirmativa de que estão querendo excluir o MP da investigação. Como posso excluir o que nunca esteve incluído?

ZH – A sua proposta não abre brechas à atuação de organizações criminosas?

Lourival – Esse discurso não procede. A maioria dos processos conduzidos pelo MP está sub judice. Por quê? Porque poderia ter encaminhado para a polícia fazer, e não o fez. A polícia tem parâmetros para a apuração, como prazos e controle do Judiciário. O MP, não.

ZH – Essa disputa de competência entre polícia e MP é antiga. O senhor, como delegado, não está tomando parte de um dos lados?

Lourival – Estou tomando um lado, mas como deputado e em defesa da Constituição. O que está ocorrendo é uma invasão de competência, um atentado violento ao Estado democrático. O MP tem de parar de investigar e cumprir sua função. Está cheio de processos nos tribunais, vamos cumprir os prazos e julgar os processos. Agora, se eles não dão conta da própria obrigação, como é que vão dar conta do que não é da sua competência.

“A emenda defende interesses corporativos das polícias”. Victor Hugo Azevedo, Presidente da Associação do MP

Com 28 anos de carreira no MP e presidente da associação gaúcha da categoria, o promotor Victor Hugo Azevedo afirma que a PEC 37 afronta a Constituição e a Convenção de Palermo, tratado internacional de combate ao crime do qual o Brasil é signatário. Segundo Azevedo, a diversificação das investigações garante a autonomia na condução do inquérito, impedindo ingerências políticas.

Zero Hora – Como o MP está acompanhando a tramitação da PEC 37?

Victor Hugo Azevedo – Acompanhamos com muita preocupação. A emenda defende exclusivamente interesses corporativos das polícias e, acima deles, está o interesse público. Quando se começa a restringir a possibilidade de investigação de fatos criminosos, estamos concentrando nas mãos de alguns o poder de dar início às ações penais. As polícias ainda carecem de autonomia. Elas estão subordinadas ao poder político. Se só eles puderem desencadear investigações, estaremos na mão dos governantes para dizer o que deve ser investigado ou não.

ZH – Os defensores da proposta dizem que a Constituição não atribui ao MP o poder de investigar. Essas investigações são ilegais?

Azevedo – O capítulo do MP na Constituição garante a investigação. E por inúmeras vezes o Supremo Tribunal Federal já disse que elas são constitucionais. Se o MP pode promover a ação penal, é óbvio que ele precisa deter os meios necessários para instrumentalizar o processo.

ZH – E quanto às críticas de que as investigações do MP não estão sob o controle do Judiciário e não têm prazo definido?

Azevedo – Tanto o Conselho Nacional do Ministério Público quanto os MPs estaduais vêm regulamentando os procedimentos de investigação criminal. Temos regramento, com prazos definidos e um sistema de controle interno feito pelas corregedorias.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É mais um projeto absurdo no falido sistema criminal brasileiro. Primeiro, a apuração das ilicitudes é feita de forma burocratizada e anacrônica envolvendo uma peça assessória que só causa lentidão nos processos, divergências entre autoridades, anulação de provas testemunhais, amarração das polícias, descrédito na justiça e retrabalho em juízo. Segundo, a investigação deveria ser desburocratizada e concedida a todas as forças policiais (ciclo policial completo), ao MP (investigação de ilícitos envolvendo autoridade pública) e aos demais órgãos encarregados de apurar ilicitudes nos seus departamentos e organizações (apuração administrativa). A apuração formal deveria ficar restrita em processo judicial onde a autoridade judicial recebe a denúncia do MP, toma o depoimento das partes envolvidas e anexa as provas obtidas pelas forças policiais para o julgamento e sentença devida do caso.

Chega de amadorismo no Brasil.

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