O Brasil precisa de um Ministério Público fiscal, probo, desburocratizado e inserido num Sistema de Justiça Criminal ágil, integrado e coativo, próximo das questões de ordem pública e envolvido dentro das corregedorias na defesa e execução das leis e na consolidação da supremacia do interesse público, contra a corrupção, imoralidades, improbidades, criminalidade e violência que afrontam a confiança nos Poderes, o erário, a vida, a educação, a saúde, o patrimônio e o bem-estar do povo brasileiro.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

O MINISTÉRIO PÚBLICO E OS DETENTORES DO PODER ABSOLUTO



ZERO HORA 27 de maio de 2016 | N° 18536



FABIANO DALLAZEN
Subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais do Ministério Público





Ataque ao Ministério Público, num momento de grave crise política, não me causa espanto. Tampouco atribuir-lhe excessos e hipertrofia de poderes como causas de desestabilização da democracia. Não é de hoje que a instituição gera desconfortos e dissabores a integrantes da própria estrutura estatal e de outrora intocados segmentos do tecido social que têm seus interesses contrariados.

Em realidade, aqueles que de fato pretendem exercer (ou ver exercido) o poder de forma absoluta é que não se conformam com o perfil independente da instituição, inserta no sistema de freios e contrapesos da República, pois têm encontrado na atuação ministerial um obstáculo intransponível às suas pretensões.

Nesse sentido, cogitar de hipertrofia constitucional do Ministério Público significa mitigar o trabalho que pavimentou o perfil proativo da instituição e a elevou ao status constitucional.

As prerrogativas, muitas vezes proposital e maliciosamente confundidas com privilégios, foram conferidas pelo constituinte de forma proporcional às relevantes responsabilidades que lhe foram designadas, especialmente tendo em vista a missão de fiscalizar os poderes do Estado.

A propósito, a evolução da atividade investigativa e da eficiência fiscalizatória no combate à corrupção têm relação direta com a independência do Ministério Público quanto às demais esferas de poder. Como resultado dessa atuação autônoma e eficaz, emerge a confiança da sociedade no trabalho da instituição e, de outro lado, mais dificuldade para que atuações defensivas outrora consideradas de solidez absoluta sejam determinantes para impunidade.

A legitimação social do Ministério Público, seus deveres e prerrogativas são decorrência, portanto, de um processo histórico de construção do mais genuíno vínculo de confiança com a sociedade civil, credibilidade que lhe permite, mesmo em tempos difíceis, atacar condutas ilícitas daqueles que ainda imaginam deter o poder absoluto.

domingo, 10 de janeiro de 2016

O MISTÉRIO PÚBLICO



ZERO HORA 10 de janeiro de 2016 | N° 18410



FLÁVIO TAVARES*




A diferença é de apenas uma sílaba e a pronúncia pode até nos confundir, mas “mistério” e “Ministério Público” nada têm entre si. Nem sequer são parentes próximos ou distantes, como os primos que vemos a cada década ou só em velório da família. A Constituição de 1988 deu ao Ministério Público uma independência tal, que os procuradores e promotores de Justiça (e até os defensores públicos) passaram a ser uma espécie de guardiães da vida social e das leis. Com eles, não há mistério.

Basta observar a atuação dos procuradores que investigam o assalto à Petrobras para ter noção da independência que a Justiça pode alcançar.

Mas “nem todos são como eles”, me dizem, e é verdade. Eles, porém, são o exemplo a seguir, não o modelo a descartar. Com afinco e eficiente metodologia, desmascararam e encarceraram velhos e intocáveis criminosos que se refestelavam na condição de grandes empresários, banqueiros, altos funcionários e políticos de diferentes partidos (do PT, PMDB, PP, PSDB e outros), junto a “doleiros” e outros marginais do crime organizado.

O mistério surge como fantasma, porém.

A “Medida Provisória 703”, redigida e adotada pelo governo federal ao expirar 2015, exclui o Ministério Público de participar dos “acordos de leniência” em que as empresas delatam suas próprias fraudes e crimes em troca de benefícios nas penas. Até aqui, o Ministério Público participava obrigatoriamente dos acordos, impondo deveres e restrições aos que se autoincriminavam. Por exemplo: as empresas eram excluídas de novos contratos com órgãos estatais, tal qual ocorreu com a Setal, a Camargo Corrêa e a Andrade Gutierrez, que admitiram fraudes na Petrobras, na Eletrobras e nas obras da Copa do Mundo.

A “Medida Provisória 703”, porém, ameniza a punição aos corruptores “arrependidos”. Agora, bastará que admitam a culpa e devolvam o roubado (ressarcindo a vítima) para que se declare “extinto o crime”. E tudo sem a vigilância obrigatória do Ministério Público, do Tribunal de Contas e da Controladoria da União.

Em contrapartida, a Advocacia-Geral da União (um apêndice do poder central) fica à vontade para acertar “acordos de leniência” e declarar extintos os crimes dos grupos privados implicados na corrupção, sem mais punições. Em palavras chãs: os ladrões estão livres para voltar a assaltar.

Experientes, conhecendo os mecanismos do poder e a debilidade humana, inventarão novas formas de suborno!

O mistério torna-se público e me pergunto: por que tudo isso? Se, no assalto à Petrobras, o país se regozija pela punição de todos os agentes do crime, por que suavizar o papel dos corruptores? Por que aviltar o princípio universal e secular de que o crime não desaparece com a devolução do roubo? Por acaso, o ladrão se torna inocente por ressarcir a vítima?

Quando a Operação Lava-Jato revelou o conluio funesto do público com o privado, as vozes do ministro da Justiça e do advogado-geral da União se levantaram em favor das empresas implicadas. Diziam que puni-las significaria “paralisar o país”. Agora, ambos assinam (junto aos ministros da Fazenda e do Planejamento) a “medida provisória” da presidente Dilma que permite o retorno dos criminosos à cena do crime.

Mais insólita ainda é a pressa. A “medida provisória” foi aprovada apenas no Senado. Falta o “sim” da Câmara Federal, mas já foi publicada no Diário Oficial e está em vigor, independentemente de eventuais alterações futuras dos deputados.

Aos jornais, o advogado-geral, Luís Inácio Adams, defendeu a urgência: “Era importante estabelecer uma eficácia imediata para viabilizar decisões nesse assunto”, disse.

Isto significa igualar honestos e desonestos?

Aqui no Estado, honestos empresários e corretos altos funcionários foram desastradamente igualados aos larápios na multimilionária fraude da CEEE, no governo Pedro Simon. O roubo supera R$ 800 milhões em valores atuais sem jamais ter sido julgado.

Tivemos oito governadores desde então, mas tudo segue oculto, às portas da prescrição. O Ministério Público não penetrou no mistério público ou faltou aqui o juiz Sergio Moro?

*Jornalista e escritor